Gabriela e as outras

Para os leitores acostumados às personagens femininas de Jorge Amado marcadas como mulheres sensuais, este livro sobre a intenção maior do escritor frente ao problema racial e social da mestiça no ambiente provinciano da Ilhéus de décadas atrás irá causar um grande prazer por franquear uma visão mais profunda da construção da antológica Gabriela.

A representação da mulher em Gabriela, cravo e canela assinala o enredo pelo leque de personagens femininas nas mais diversas posições, desde a típica figura da esposa e mãe, até a das solteironas e, no lado oposto, das empregadas domésticas, das raparigas e das prostitutas, passando pelo grande retrato de Malvina, negando o poder do pai, e de Sinhazinha transgredindo a moral. No centro, ela, Gabriela, e as teorias que se podem tecer como podemos concluir com a leitura agora.

Nessa perspectiva, o ensaio de Rosana Ribeiro Patrício vem no rastro de posicionamentos outros como o de Manuel Antonio de Almeida em Memórias de um Sargento de Milícias, de Aluísio Azevedo, em O cortiço com a sua mestiça Rita Baiana e de Coelho Neto em Turbilhão, para chegar a Jorge Amado, que defende a mistura das raças como solução para o preconceito. Daí Gabriela, mestiça que passa de mera empregada e amante para esposa do patrão e retorna à condição anterior fazendo valer sua personalidade independente das convenções sociais para alcançar a verdadeira identidade e, portanto, a felicidade.

O ensaio de Rosana responde por este apelo do escritor sobrelevado pelo desejo de uma abordagem da mestiça diferente dos padrões supracitados assumidos pelos demais escritores. A originalidade deste livro em relação a outras leituras da obra jorgeamadiana está no traçado de Gabriela para além da superficialidade de uma especulação sobre a sensualidade da mulata brasileira. Neste sentido, fica cada vez mais pertinente a discussão de Rosana Ribeiro Patrício, que avança para mais ver e mais refletir, e é assim que a ensaísta se inscreve de forma marcante no lugar do discurso crítico coetâneo.

Texto escrito por Gerana Damulakis

Sobre o autor (a): Rosana Ribeiro Patrício é natural de Salvador – Bahia (1958), graduada em Letras Vernáculas (UFBA), com Mestrado (UFPB) e Doutorado em Letras pela Universidade de São Paulo. Leciona Teoria Literária e Literatura Brasileira nos cursos de Letras da Universidade Estadual de Feira de Santana. Desenvolve pesquisas sobre a presença da mulher, como autora e personagem, na literatura brasileira contemporânea.